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Celly Campello, ‘a garota do momento’ de 1959 a 1962, tem contado em livro o pioneiro reinado no rock brasileiro


♪ Entre 1959 e 1962, Celly Campello foi a garota do momento. Uma garota com ar angelical, bela, recatada e do lar dividido com a família em Taubaté (SP), cidade do interior do estado de São Paulo. Tanto recato jamais impediu Célia Campello Gomes (18 de junho de 1942 – 4 de março de 2003) de ser a primeira popstar feminina do então ainda incipiente rock do Brasil quando Célia foi transformada em Celly.
O reinado de Celly Campello é reconstituído e documentado para a posteridade, em detalhes, no livro Garota fenomenal – Celly Campello e o nascimento do rock no Brasil, lançado pela editora Noir.
Embora os autores Gonçalo Junior e Dimas Oliveira Junior contextualizem bem a abertura do mercado fonográfico para uma música pop e ingênua clonada do pop norte-americano dos anos 1950 e embalada com o rótulo de rock para o público adolescente e jovem (segmento até então desprezado pelas gravadoras no Brasil), o livro Garota fenomenal é bem-vinda biografia calcada somente em Celly Campello.
A narrativa começa com a dificuldade de o também cantor Tony Campello, irmão de Celly, convencer parte da diretoria da gravadora Odeon a permitir que a então quase desconhecida cantora gravasse a música que mudaria a vida da artista. E o próprio mercado. Essa música era Estúpido cupido, versão em português de Stupid cupid (Neil Sedaka e Howard Greenfield, 1958), escrita por Fred Jorge (1928 – 1994), compositor letrista especializado em versões.
Atualmente com 88 anos e personificado no livro como o mentor e anjo protetor da artista na carreira musical, papéis que de fato desempenhou, Tony Campello se saiu vitorioso na missão.
Com a escalada de Estúpido cupido nas paradas de 1959, o público jovem do Brasil passou a idolatrar Celly Campello e o resto foi história quando a ex-cantora saiu de cena em 2003, em decorrência de tumor na cabeça descoberto casualmente após uma queda noturna na casa em que vivia com o marido, já distante dos holofotes abandonados em 1962.
Capa do livro ‘Garota fenomenal – Celly Campello e o nascimento do rock no Brasil’, de Gonçalo Junior e Dimas Oliveira Junior
Divulgação
No que diz respeito à vida pessoal da estrela, a narrativa do livro fica quase sempre na superfície. O valor da biografia Garota fenomenal reside mais no relato detalhado da trajetória fonográfica da artista, disco a disco, música a música. Cada gravação é analisada no livro.
Gonçalo Junior e Dimas Oliveira Junior mostram como a ingenuidade de Celly fez com que os moralistas da época nem notassem a malícia sensual que havia nos versos de Banho de lua, escritos por Fred Jorge – sempre ele! – sem absoluta fidelidade à letra original da canção italiana Tintarella di luna (Bruno Defilippi e Francesco Migliacci, 1959), sucesso da cantora Mina. Banho de lua dominou as paradas de 1960, rivalizando com o sucesso de Estúpido cupido na discografia de Celly.
Antes, em julho de 1959, a cantora atravessou Túnel do amor, versão em português do recorrente Fred Jorge para Have lips will kiss in the tunnel of love (Bob Roberts e Patty Fischer, 1958), música apresentada ao mundo na voz da cantora Doris Day (1922 – 2019). Em agosto daquele mesmo ano de 1959, Lacinhos cor-de-rosa (Pink shoe laces) (Mickie Grant, 1959, em versão em português de Fred Jorge) amarrou de vez Celly ao jovem da época.
Pelo temperamento dócil, moldável, Celly Campello personificou o brotinho encantador no imaginário pop nacional da pré-história do rock brasileiro. Ainda assim, a cantora foi atacada pelos formadores de opinião.
Como o livro lembra, o sempre controvertido apresentador de TV Flávio Cavalcanti (1923 – 1986) blasfemou no ar contra o repertório de Celly, ignorando o gosto dos brotos legais que consumiam aquela música que soava cheia de frescor para o jovem que nunca se identificara com os dramalhões dos sambas-canção da época.
Resultado de seis anos de pesquisa e entrevistas com figuras fundamentais na vida de Celly (com os irmãos Nelson Filho e Tony Campello, além do viúvo Eduardo Chacon, morto em dezembro de 2023), o livro Garota fenomenal detalha cada passo profissional da cantora e lembra a intempestiva decisão de Celly de abandonar a carreira no auge em 1962 para se casar.
O livro também mostra como as tentativas de voltas foram todas frustradas, ainda que o sucesso da novela Estúpido cupido (TV Globo) em 1976 tenha lembrado ao Brasil que, antes dos ídolos da Jovem Guarda, houve brotos legais como Sérgio Murilo (1941 – 1992) e Celly Campello, primeira rainha do rock do Brasil.
Para quem acha que tudo começou na Jovem Guarda, o livro Garota fenomenal presta excelente serviço à bibliografia musical brasileira por jogar luz sobre uma pré-história minimizada – quando não inteiramente apagada – da história oficial do rock nacional.

Fonte da Máteria: g1.globo.com