Consumidores e criadores de conteúdo relatam prejuízos financeiros e emocionais devido à plataforma. O OnlyFans diz que está construindo um site seguro para os criadores expressem ‘seu lado mais autêntico’. Melinda Lam descobriu que o marido gastou cerca de R$750 mil na plataforma OnlyFans.
Reuters
O marido de Melinda Lam tinha um segredo.
Lam disse que ela o descobriu depois que um pagamento com cartão de crédito para as aulas de caratê do seu filho foi recusado em dezembro de 2021. Isso levou a farmacêutica de 46 anos do Colorado, nos Estados Unidos, a verificar as contas que compartilhava com o marido.
Pelo menos seis cartões de crédito estavam no limite máximo, disse ela, e quase 40.000 dólares foram tirados de suas economias. O extrato de um cartão sugeria para onde o dinheiro poderia ter ido.
“Dizia OnlyFans, OnlyFans, OnlyFans”, lembrou Lam, que na época estava fazendo quimioterapia para câncer de mama.
O marido dela gastou 135 mil dólares (cerca de R$ 750 mil na cotação do dia 11 de outubro) com criadores de pornografia no OnlyFans, um site que possui assinatura, de acordo com Lam e os registros que ela compartilhou com a Reuters.
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Ela disse que está se preparando para declarar falência – e finalizando o divórcio.
“Não foi apenas chocante”, afirmou ela, “foi devastador”.
O OnlyFans e seus apoiadores retratam a plataforma como uma saída segura para o trabalho sexual lucrativo e socialmente aceitável. Enfermeiros, professores, policiais e atletas olímpicos têm publicado conteúdo picante em busca de dinheiro extra.
No entanto, à medida que o OnlyFans leva a pornografia para o holofote, a plataforma também tem gerado efeitos em cascata que mudaram vidas de maneiras inesperadas e, às vezes, traumatizantes.
A Reuters relatou alguns dos danos mais diretos em investigações que expuseram material de abuso sexual infantil e pornografia não consensual ou “pornografia de vingança” publicada no site.
Essas descobertas foram extraídas de boletins policiais obtidos de mais de 250 das maiores agências de segurança dos Estados Unidos.
Mas os documentos também revelam danos colaterais: famílias separadas, reputações ameaçadas, finanças arruinadas.
Além de Melinda Lam, que disse que a farra de compras de pornografia do marido destruiu seu casamento, os boletins da polícia descrevem um criador que, sem querer, fez vídeos de sexo para um parente próximo; mulheres e meninas chocadas ao descobrirem que suas imagens foram roubadas para vender pornografia; e transeuntes que encontraram homens nus fazendo pornografia em público para seus “fãs”. Outro criador filmou a si mesmo em atos lascivos com um cachorro.
“Há algo diferente acontecendo com o OnlyFans”, disse Meagan Tyler, pesquisadora da Universidade La Trobe, da Austrália, especializada em danos contra mulheres na pornografia.
“Está realmente afetando as normas e até mesmo nossas experiências cotidianas em locais públicos, dentro de casas, em relacionamentos – e está tendo esse efeito mesmo que nunca tenhamos visitado o site.”
O OnlyFans não respondeu às perguntas sobre o caso de Lam ou sobre outros casos desta reportagem.
Em seu site, no entanto, o OnlyFans diz que está construindo a plataforma de mídia digital mais segura do mundo para que os criadores expressem “seu lado mais autêntico”.
Em um discurso no ano passado, a presidente-executiva Keily Blair descreveu o OnlyFans como uma “comunidade real” onde os criadores e assinantes têm “conversas mais agradáveis, gentis e solidárias” do que em outras plataformas.
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Durante suas interações com os assinantes, os criadores vendem conteúdo personalizado e solicitam dinheiro extra.
Essa é uma fórmula comprovadamente vencedora: ao se oferecer para tornar os criadores mais ricos e os consumidores menos solitários, o OnlyFans obtém enorme sucesso na monetização do pornô – um produto que, de outra forma, estaria amplamente disponível online gratuitamente – e ajudou a revolucionar o negócio.
O OnlyFans obteve uma receita de 1,3 bilhão de dólares (cerca de R$ 7 bilhões na cotação de 11 de outubro) somente em 2023.
Os principais criadores ganham milhões de dólares por ano e seu sucesso gerou um setor livre de promotores e agências de talentos.
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‘EU SEI QUE VOCÊ PRECISA DE MAIS DINHEIRO’
Às vezes, os próprios criadores do OnlyFans ficam traumatizados.
Em março de 2020, quando as cidades dos EUA entraram em lockdown devido à pandemia, uma mulher de 21 anos de Seattle, nos Estados Unidos, perdeu o emprego como garçonete de um restaurante.
Ao buscar uma maneira rápida de pagar as contas, ela criou uma página no OnlyFans e publicou fotos sensuais de si mesma.
Logo, segundo ela, um homem pagou 25 dólares por mês para se inscrever em sua conta. Ele também começou a enviar mensagens diretamente para ela na plataforma, dizendo que pagaria mais por vídeos mais picantes.
“Ele estava obcecado por mim”, disse a mulher, que falou sob condição de ser identificada por suas iniciais, D.W., para preservar sua privacidade.
Após cerca de um ano e meio, ela fechou a conta no OnlyFans.
“Simplesmente me cansei”, afirmou ela. “Simplesmente não era para mim.”
Mas o acordo com seu fã mais entusiasmado continuou depois que ele a encontrou no Instagram.
A mulher ainda precisava de dinheiro, disse ela, e ele pagou bem – cerca de 10.000 dólares (quase R$60 mil na cotação do dia 11 de outubro) por fotos e vídeos explícitos dela por mais de dois anos.
“O que você está vestindo? Porque eu sei que você precisa de mais dinheiro”, enviou ele em uma mensagem no Instagram, de acordo com uma captura de tela do Departamento de Polícia de Seattle.
“Ele enviava mensagens do tipo: ‘Gostaria que estivéssemos na cama juntos agora'”, disse D.W. em uma entrevista. “Gostaria de poder construir uma família com você.”
Ele pagava para que ela o chamasse de “papai”, mostram as capturas de tela, e a chamava de “prostituta”.
Em julho de 2022, o homem ligou para ela no Instagram, e revelou: “Aqui é seu tio Eugene”.
De acordo com o relato dela à polícia, ele era o marido da irmã de sua mãe.
“Eu não vejo você como minha sobrinha, eu vejo você como uma mulher”, ela se lembra dele dizendo. “Por favor, não conte para sua tia.”
Ela não conseguia acreditar, ela disse à Reuters.
“Eu gritei e fiquei tipo, ‘Como você pôde fazer isso comigo?’” Ele respondeu, “Sinto muito, eu sou uma pessoa doente.”
A provação de DW destaca um risco fundamental para os criadores do OnlyFans: eles geralmente não sabem a verdadeira identidade nem mesmo de seus assinantes mais leais.
Os criadores conhecem seus fãs pelos nomes de usuário que eles escolhem — o tio de DW se autodenominava “Wizard”. Eles podem acabar sendo parentes, empregadores, ex-namorados ou perseguidores.
“Foi uma das piores coisas que já me aconteceram na vida”, concluiu D.W.
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Fonte da Máteria: g1.globo.com