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Alaíde Costa converte ‘encrenca’ em show memorável ao encarar o disco ‘Domingo’ de Gal e Caetano Veloso


Cantora se afina com Ayrton Montarroyos em show feito sob direção musical em que Rodrigo Campos é bem fiel à sonoridade do álbum lançado em 1967. Aos 88 anos, Alaíde Costa encara o ‘desafio’ de interpretar as músicas do disco de 1967 em show no Teatro Raul Cortez do Sesc 14 Bis, em São Paulo (SP)
Kleber Urbano / Produção Alaíde Costa
Resenha de show
Título: Alaíde Costa canta “Domingo” de Gal e Caetano
Artista: Alaíde Costa – com participação de Ayrton Montarroyos
Local: Teatro Raul Cortez – Sesc 14 Bis (São Paulo, SP)
Data: 17 de julho de 2024
Cotação: ★ ★ ★ ★ ★
♪ Nascida em dezembro de 1935, Alaíde Costa tinha 31 anos em julho de 1967 quando a gravadora Philips lançou o LP Domingo, primeiro álbum de Caetano Veloso e Gal Costa (1945 – 2022). Alaíde ouviu o disco, se encantou com as músicas e acalentou desde então o sonho de dar voz ao repertório de Domingo.
Decorridos 57 anos, a cantora carioca realizou enfim o sonho no palco do Teatro Raul Cortez do Sesc 14 Bis, na cidade de São Paulo (SP), nas noites de 16 e 17 de julho.
Em duas concorridas apresentações do show viabilizado por Thiago Marques Luiz, produtor e empresário da cantora de 88 anos, Alaíde Costa se juntou a Ayrton Montarroyos – cantor cuja alma musical antiga desmente os 29 completados pelo artista em 27 de junho – para encarar o que caracterizou em cena como “desafio”.
“Essas músicas parecem fáceis, mas não são…”, pontuou a cantora na segunda das duas apresentações do show Alaíde Costa canta “Domingo” de Gal e Caetano. Em outro gracejo no palco, Alaíde chegou a se referir à música Candeias (1967) como “encrenca” antes de interpretar com o devido requinte a composição de Edu Lobo.
E o fato é que Alaíde converteu a “encrenca” em show memorável em que abriu generoso espaço no roteiro para a participação luxuosa de Ayrton Montarroyos sem perder o protagonismo.
A direção musical de Rodrigo Campos resultou extremamente fiel à sonoridade de Domingo, álbum viabilizado pelo executivo João Araújo (1935 – 2013) com arranjos divididos entre Dori Caymmi (produtor musical do disco), Francis Hime e Roberto Menescal.
Alaíde Costa e Ayrton Montarroyos se entrosam quando cantam juntos músicas como ‘Zabelê’ e ‘Um dia’
Kleber Urbano / Produção Alaíde Costa
Em cena, Alaíde e Ayrton venceram o desafio de dar vozes a um repertório sofisticado com o toque luxuoso de fantástico quarteto formado por Rodrigo Campos (violão) com Ariane Rodrigues (flauta), Arquétipo Rafa (bateria e percussão) e Marcelo Cabral (baixo). Entrosados, cantores e músicos transitaram entre o samba, a canção e o samba-canção.
Com exceção das cordas, o show reuniu os instrumentos básicos do álbum Domingo, sendo que o sopro da flauta de Ariane Rodrigues exalou toda a melancolia e o lirismo entranhados no disco em que Gal se portou como a Gracinha devota de João Gilberto (1931 – 2019) em sintonia com um Caetano Veloso de espírito ainda pré-tropicalista (Caetano organizaria o movimento com Gilberto Gil somente após o lançamento do LP Domingo).
A propósito, o produtor Thiago Marques Luiz selecionou três composições de Caetano dessa fase pré-Tropicália – todas três de 1965 – para compor o roteiro juntamente com as 12 músicas de Domingo.
No set solo, antes de Alaíde Costa cair no samba É de manhã (Caetano Veloso, 1965), Ayrton Montarroyos iluminou Sol negro (Caetano Veloso, 1965) com a voz aveludada, pôs o samba Remelexo (Caetano Veloso, 1967) na roda baiana e fez a melhor abordagem da canção Sim, foi você (Caetano Veloso, 1965) desde o registro original de Gal Costa em single lançado em 1965, evidenciando toda a beleza da música.
Dono de canto refinado, Ayrton brilhou como um sol na noite ao longo de todas as intervenções do artista, mas coube a Alaíde Costa, por mérito e justiça, a grande ovação do público.
Desde que entrou em cena para cantar Avarandado (Caetano Veloso, 1967), mergulhando na sequência em Onde eu nasci passa um rio (Caetano Veloso, 1967), Alaíde exibiu porte de rainha e, aparentemente mais segura do que na apresentação anterior, alcançou todas as notas, acertou as letras e – mais importante – encontrou o tom e o sentido das interpretações de músicas como Coração vagabundo (Caetano Veloso, 1967) e Minha senhora (Gilberto Gil e Torquato Neto, 1967), expressando as intenções de cada compositor em versos sobre amor, saudade e tristeza.
Nos duetos, Alaíde e Ayrton exibiram total interação quando sustentaram a leveza de Zabelê (Gilberto Gil e Torquato Neto, 1967), desfolharam a poesia de Domingo (Caetano Veloso, 1967) exprimiram a doçura triste e reflexiva de Nenhuma dor (Caetano Veloso e Torquato Neto, 1967), caíram no samba Maria Joana (Sidney Miller, 1967), expuseram o desalento de Quem me dera (Caetano Veloso, 1967) e fizeram a festa matinal de Um dia (Caetano Veloso, 1967).
Um dia e Quem me dera apareceram lado a lado no roteiro – link sagaz ausente no álbum de 1967 – porque ambas são canções irmãs na poesia que versa sobre idas e voltas.
No bis, Coração vagabundo bateu novamente afinado, desta vez em dueto de Alaíde Costa com Ayrton Montarroyos. Naquela altura, os artistas e o público já celebravam a encrenca em que a já atemporal cantora se meteu para realizar sonho antigo que teve lá em 1967, há 57 anos, quando ouviu o Domingo de Gal Costa e Caetano Veloso.
Alaíde Costa e Ayrton Montarroyos se alternam entre solos e duetos do roteiro que totaliza 15 músicas
Kleber Urbano / Produção Alaíde Costa
♪ Eis as 15 músicas do roteiro seguido por Alaíde Costa e Ayrton Montarroyos em 17 de julho de 2024 na segunda das duas apresentações do show Alaíde Costa canta “Domingo” de Gal e Caetano no Teatro Raul Cortez do Sesc 14 Bis na cidade de São Paulo (SP):
1. Avarandado (Caetano Veloso, 1967) – Alaíde Costa
2. Onde eu nasci passa um rio (Caetano Veloso, 1967) – Alaíde Costa
3. Minha senhora (Gilberto Gil e Torquato Neto, 1967) – Alaíde Costa
4. Coração vagabundo (Caetano Veloso, 1967) – Alaíde Costa
5. Candeias (Edu Lobo, 1967) – Alaíde Costa
6. Nenhuma dor (Caetano Veloso e Torquato Neto, 1967) – Alaíde Costa e Ayrton Montarroyos
7. Um dia (Caetano Veloso, 1967) – Alaíde Costa e Ayrton Montarroyos
8. Quem me dera (Caetano Veloso, 1967) – Alaíde Costa e Ayrton Montarroyos
9. Maria Joana (Sidney Miller, 1967) – Alaíde Costa e Ayrton Montarroyos
10. Remelexo (Caetano Veloso, 1967) – Ayrton Montarroyos
11. Sim, foi você (Caetano Veloso, 1965) – Ayrton Montarroyos
12. Sol negro (Caetano Veloso, 1965) – Ayrton Montarroyos
13. É de manhã (Caetano Veloso, 1965) – Alaíde Costa
14. Domingo (Caetano Veloso, 1967) – Alaíde Costa e Ayrton Montarroyos
15. Zabelê (Gilberto Gil e Torquato Neto, 1967) – Alaíde Costa e Ayrton Montarroyos
Bis:
16. Coração vagabundo (Caetano Veloso, 1967) – Alaíde Costa e Ayrton Montarroyos

Fonte da Máteria: g1.globo.com